Mundo árabe e mundo judeu, dois polos que fazem do Oriente Médio, uma região geopolítica demasiadamente complexa e sujeita ao acendimento de estopins nesse barril de pólvora.
Entretanto, causou espanto na comunidade internacional o anúncio de que Israel e Emirados Árabes Unidos se comprometeram a estabelecer relações diplomáticas. Esta “bomba” de notícia foi divulgada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no dia 13 de agosto.
Os americanos serviram de mediadores entre as duas partes e Trump ainda disse que Israel estabelecerá “a normalização total das relações” com os xeques.
Ademais, os israelenses engavetarão ou suspenderão por tempo indeterminado suas intenções de anexar a Cisjordânia ao seu território. Até lá, a terra de Davi e de Salomão envidará todo esforço possível na busca pela paz na região e criar laços com outros países árabes.
Para o lado judeu, representa mais um passo e um alívio nas tensas relações com seus vizinhos. Também é uma vantagem potencial para eles, pois os Emirados Árabes são o primeiro parceiro do Golfo Pérsico a tenderem favoravelmente a Israel.
Antes sobre esse avanço surpreendente, Israel já tinha conseguido um acordo com o Egito, em 1979, e com a Jordânia, em 1994. O governo jordaniano manifestou que a paz na região será plena se isto trouxer um progresso para que se acabe “com a ocupação israelense dos territórios palestinos” e desde que se permita a criação de um Estado independente para os palestinos, referindo-se às terras ocupadas desde 1967.
Azedou
Pega no contrapé, a Autoridade Palestina chamou seu embaixador em Abu Dhabi, no intuito de fornecer mais explicações sobre a atitude dos Emirados, e pediu uma reunião de emergência da Liga Árabe. Mahmoud Abbas se pronunciou contra o acordo firmado entre as três partes (uma vez que foram os EUA mediadores dessa negociação bem discreta).
O grupo muçulmano Hamas também reagiu mal ao acordo.
Outro país que chiou bastante foi o Irã, o qual observa que “o comportamento de Abu Dhabi não tem justificativa, virou as costas à causa palestina. Um erro de estratégia”, conforme escrito pelo ex-vice-chanceler Hossein Amir-Abdollahian em seu Twitter.
Uma das consequências da distensão entre Israel e Emirados Árabes será a minimização ou a neutralização da influência do Irã no Oriente Médio.
Tanto um quanto outro sentem-se incomodados com a presença e apoio crescentes dos iranianos, visto como ameaçador.
Bandeira branca
O cientista político da Universidade de Bar Ilan, Menachem Klein, acha que o acordo tem importância simbólica. Em sua análise nunca houve, tecnicamente, problemas, ataques ou uma guerra declarada de Israel à terra dos emires e confirma a tese de que paira sobre o mundo árabe a sombra apavoradora dos iranianos na região. “O Irã é uma ameaça mais aguda do que o tema da Palestina”. Outro especialista judeu, Eytan Gilboa, aposta numa maior legitimidade do Estado de Israel perante o Oriente Médio, baixando um pouco a hegemonia de Teerã.
Ahmed Al Najjar é pró-reitor em uma Universidade de Abu Dhabi e acredita que o estabelecimento de relações com Israel “é muito importante”.
Segundo ele, “nossa liderança tem uma mentalidade de futuro, com coração tolerante e atitude de unidade (...). Nosso objetivo é servir à paz.”
Os gestos do alto escalão de ambos os lados são bem diferentes do que há cinquenta, sessenta anos atrás. O premiê israelense, Benjamim Netanyahu, alardeou em 2019 que seu país já não era considerado como a “ovelha negra” por vários países árabes. Era mais encarado como um “aliado” às pretensões pouco transparentes do Irã.
A sequência de namoro entre árabes e judeus veio em 2020: uma visita de Netanyahu a Omã em janeiro e o envio de um avião vindo dos Emirados Árabes rumo a Tel-Aviv com uma doação humanitária no combate à Covid-19.
Mesmo sob uma chuva de reações exaltadas e de oposição ao acordo, o príncipe herdeiro dos Emirados Árabes, Mohammed Bin Zayad, limitou-se em dizer que Israel havia concordado em suspender a anexação da Cisjordânia.
Estreito e íntimo
A Casa Branca emitiu uma nota, na qual Donald Trump menciona que os dois lados vão se reunir nas próximas semanas para assinarem acordos bilaterais em diversas áreas: tecnologia, investimentos, cultura, voos diretos entre os países, turismo, segurança, energia, meio ambiente entre outros temas. Na mesma nota, Israel concordou em expandir as negociações com outros países do Oriente Médio.
Porém, os Estados Unidos adiantam que outra surpresa pode surgir em breve para o mundo: é que Israel e outro país árabe estão em fase final de acordo diplomático. Se tudo der certo, num espaço de três meses, uma nova caixinha de surpresas deverá ser aberta. Só não foi divulgado qual país está dialogando com Israel.
No próprio dia 13 de agosto, a Prefeitura de Tel-Aviv foi iluminada com as cores da bandeira dos Emirados Árabes Unidos.