Nunca se pode achar que se está livre do poder da Natureza, mesmo que certos fenômenos e catástrofes tenham um intervalo acentuado.
Assim, existem algumas comparações entre as tragédias de Lisboa, em 1755, e de Fukushima, em 2011: da primeira só se tem registro nos livros e nos relatos populares. A semelhança com o horrível acontecimento do Japão aparece no terremoto seguido de maremoto.
Entretanto, no século XVIII não se conhecia a energia nuclear, embora boa parte da iluminação da capital portuguesa vinha de velas, estas mesmas que geraram um incêndio por toda a cidade.
Bem verdade que a distância histórica é longa, mas é intrigante a coincidência de fenômenos naturais entre os dois eventos.
Foi em 11 de março de 2011 que o Japão assistiu a um de seus maiores flagelos naturais: sensível a terremotos a cada ano, a ilha oriental não supunha que um abalo sísmico de magnitude 9 na escala Richter ocasionasse muitos prejuízos. Desde material até psicológico.
Eram 14h46 quando tudo aconteceu e as imagens de escritórios e prédios balançando, o mar invadindo a costa nordeste japonesa e levando (como brinquedo) carros, embarcações e casas rodaram o mundo.
Assim, o poder da natureza agia, vitimando cerca de 18.500 pessoas mortas ou desaparecidas. Ademais, o tsunami marítimo provocou um colapso de funcionamento na usina nuclear de Fukushima.
Certamente, é o pior desastre do tipo desde o último acidente ocorrido em Chernobyl (na União Soviética).
Dez anos depois e exatamente no instante marcado pelo relógio, as pessoas fizeram um minuto de silêncio reverenciando aqueles cujo tempo parou na eternidade. Parentes, família, conhecidos, amigos ou até anônimos voltaram à memória.
Incentivado a declarar sua opinião, o primeiro-ministro do Japão, Yoshihide Suga, disse que “é insuportável quando penso nos sentimentos de todos aqueles que perderam seus entes queridos e amigos”.
Sequência impressionante
O epicentro do terremoto aconteceu em pleno mar, gerando ondas gigantes de até 19 metros. Em questão de meia hora, as águas já adentravam na costa do Japão.
Na província de Miyagi, por exemplo, o tsunami invadiu e destruiu cerca de 6 quilômetros além da faixa costeira. Calcula-se que a extensão do fenômeno foi de 400 quilômetros.
Profundamente impactados, cerca de 43.000 moradores e vizinhos da cidade de Fukushima tentam voltar à normalidade, mas relutam muito em voltar para suas antigas habitações.
Dano tão sério quanto na mente dos que viviam lá, foi o superaquecimento de três reatores nucleares da usina de Fukushima. O contato dos elementos contidos no local com as águas causou explosões e alastrou nuvens radioativas por mais de 1.000 quilômetros quadrados. Devido à contaminação 160.000 pessoas deixaram para trás tudo o que possuíam.
Como está hoje
Em 2021, o panorama mistura esforço, reconstrução e incertezas: máquinas e guindastes trabalham na demolição de construções próximas à usina nuclear. Os entulhos derivados dessa operação foram acondicionados em sacos e são removidos. Na área rural e campestre, o governo escolheu por instalar placas de energia solar, ao invés de permitir o regresso dos agricultores.
Certas regiões a noroeste da cidade e do complexo nuclear, registra-se radioatividade 50 vezes acima do aceitável. Mais um motivo para dividir a população: alguns preferem voltar ao local onde moravam. São pequenas famílias com crianças. Outra parcela, devido à indenização fornecida pelo Estado, estabelece suas raízes em outras cidades.
Dentre os que optam por permanecer nos arredores de Fukushima, há muitos idosos; é o caso de Tomoko Kobayashi, 68 anos, que chegou a morar em Nagoya com o filho. Acabou não se adaptando, pois achava que a comida da cidade não era tão boa quanto a de Fukushima. Voltou às origens e se integrou a um grupo local que realiza medições radioativas constantes no solo, nos alimentos e no ar. Ela assegura o consumo sem risco de arroz e verduras.
Nestes dez anos, o governo investiu 247 bilhões de euros em reconstrução e melhorias, incluindo estradas, habitações e apoio para o sustento da população.
Mesmo assim, dentro dos gabinetes de alto escalão, a tragédia de Fukushima representa pouco, já que o abalo natural não trouxe um abalo político.
Difícil de entender que a política nuclear do Japão não sofreu nenhuma revisão ou alteração.
Pesquisas indicam que a maioria dos japoneses é contrária ao uso da energia nuclear, o que não sensibilizou em nada o atual poder central. Sob a ótica da população, é mais um fator de descontentamento crescente com seus políticos, embora a cultura de protestar e de fazer ativismo não faz parte ou é desestimulada dentro da própria sociedade japonesa.