Quando a construção da Arena Corinthians foi anunciada, uma chuva de críticas recaiu sobre o clube de Pq. S. Jorge, boa parte delas vindas de torcedores do São Paulo, orgulhosos pelo estádio próprio construído sem dinheiro público. A arena corintiana, palco paulista da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas 2016, no entanto, teve tanto a doação do terreno quanto a construção completamente livres de qualquer prova de superfaturamento ou corrupção. O mesmo não se pode dizer sobre a construção do Morumbi, o maior da capital paulista, de propriedade do São Paulo Futebol Clube.
O "cambalacho" foi tão grande que, hoje, mais de 45 anos depois da inauguração, a prefeitura de São Paulo pede na justiça a anulação da doação do terreno.
Pouquíssimos são-paulinos sabem a verdadeira história por trás da construção do próprio estádio. Uma grande cortina de fumaça envolvendo uso descarado de dinheiro público e influência política resultaram na obra. Segundo a procuradoria da cidade de São Paulo, em 1951, o terreno, que hoje abriga o Estádio Cícero Pompeu de Toledo, foi loteado pela Empresa Mercantil e Comissionária Merco S.A., com o objetivo de construir conjuntos residenciais. No ano seguinte, porém, a propriedade do terreno foi repassada para a construtora Aricanduva, cujo acionista majoritário era o governador do Estado de São Paulo, Adhemar de Barros, assumidamente torcedor do 'Tricolor'.
A construtora Aricanduva doou o terreno ao São Paulo Futebol Clube, que ergueu ali seu próprio estádio, inaugurado em 1960. Segundo o processo que tramita na Procuradoria Geral do Município, por ser um bem público, o terreno não poderia ter sido doado. Na documentação que faz parte do processo, está comprovado também que, quando recebeu a doação, o São Paulo FC se comprometeu a construir, além do próprio campo, um parque infantil de livre acesso à população e um estacionamento como contrapartidas sociais.
Estas obras ficaram apenas na promessa. O clube só se preocupou em erguer o próprio campo.
A construção do maior estádio paulista começou em 1952, mas quatro anos depois, já sem um tostão no bolso, o São Paulo não tinha como continuar as obras. Foi então que o poder público entrou em ação. A prefeitura da cidade doou ao clube 10 milhões de cruzeiros (algo equivalente à metade do orçamento da USP naquela época).
A primeira parte do projeto foi inaugurada em outubro de 1960, só que os trabalhos durariam mais 10 anos e a versão final do Morumbi só ficaria pronta em 1970. Obviamente que nem o clube nem a torcida (que naquela época era menor que as torcidas de Corinthians, Palmeiras e Santos) pagariam. Muito dinheiro público e influência política seriam os combustíveis para finalizar a construção.
Em 1966, período de ditadura civil-militar (1964-85), Laudo Natel acumulava os cargos de governador do Estado e presidente do SPFC. Ele determinou que todos os estudantes da rede pública do estado vendessem carnês chamados "Paulistão", cuja finalidade seria pagar a formatura dos estudantes. O que se sabe é que boa parte do dinheiro arrecadado com esta iniciativa parou nos cofres do 'Tricolor'.
Na mesma época, com o aval e a influência de Natel, o São Paulo adquiriu empréstimo junto à Caixa Econômica Federal no valor de 5 milhões de cruzeiros. O banco Bradesco que, coincidentemente ou não, tinha Laudo Natel como um dos diretores, criou títulos financeiros em prol do São Paulo, algo parecido com os atuais CIDs da Arena Corinthians.
Fora as doações e empréstimos oficiais, muitos que viveram naquela época comentam sobre diversos desvios de materiais de construção de obras públicas para o Morumbi. Boatos difíceis de serem provados, pois naquela época vigorava a censura e a tortura. A disputa pode se arrastar por anos, mas caso o poder público saia vitorioso, o São Paulo corre grande risco de perder o seu estádio. Uma coisa porém é certa: nenhum são-paulino pode criticar a Arena Corinthians sem ter que explicar a grande maracutaia que resultou na construção do Morumbi.