Se você pudesse perguntar alguma coisa para um astronauta, o que perguntaria? Bom, um sujeito que conheceu as maravilhas do universo certamente teria muita prosa para contar, e o poeta chileno Pablo Neruda, ciente disso, não deixou de saciar suas curiosidades quando teve a oportunidade.

Tempo de cosmonautas

Esse encontro aconteceu em 1961, na antiga União Soviética, ano em que o país socialista concretizou a façanha de levar o primeiro ser humano para o espaço. Tal feito foi um marco na corrida espacial travada com os Estados Unidos, no auge da guerra fria.

Nessa corrida, os soviéticos foram os pioneiros em muitas conquistas, sendo os primeiras a: enviar o primeiro satélite artificial para orbita o planeta, o Sputnik I (1957); enviar o primeiro animal para foram da terra, a cadelinha Laika (1957); aterrissar uma sonda na lua (1959). Também não só foram os primeiros a colocar um homem em órbita, Yuri Gagarin, no dia 12 de abril de 1961, como também foram responsáveis por enviarem cinco meses depois o segundo, o cosmonauta Gherman Titov.

A dupla foi condecorada como heróis soviéticos e com a medalha Ordem de Lênin em um desfile na Praça Vermelha em novembro daquele ano. Na ocasião, Pablo Neruda, membro do Partido Comunista Chileno, havia sido convidado para essa celebração e foi apresentado ao número 2 do espaço.

O poeta achou o rapaz simpático e humilde demais para alguém que havia voado pelos céus, e, em suas palavras, disse que ‘’sentia-se muito próximo de suas asas. O ofício de poeta é, em grande parte, vaguear como os pássaros''.

Tamanha epifania diante do herói soviético fez Neruda revolver em sua imaginação todos os sonhos que tivera um dia sobre viagens espacial e acabou perguntando ao novo camarada o que toda criança chilena gostaria de saber: se era possível enxergar o Chile enquanto navegava lá em cima.

Titov, um pouco acanhado com a dúvida patriótica do chileno, respondeu ter visto algumas montanhas bem altas pela América do sul. A resposta abriu um sorriso no coração sul-americano de Pablo, que daquele dia em diante viveu tendo a certeza de que sua terra era tão grandiosa que poderia ser vista até dos rincões distantes do sistema solar.

Confesso que passei vergonha

Posteriormente, o escritor revive esse causo com certo constrangimento no seu livro de memórias ‘’Confesso que Vivi’’. Segundo ele, a pergunta feita ao cosmonauta foi como se dissesse ‘’você entende que o importante mesmo da sua viagem era ver meu Chilezinho do alto?’’. Essa e muitas outras histórias são contadas nesse livro onde o autor relembra sua vida e a vida política do Chile, mesclando a leveza de sua poesia com o peso da realidade latino-americana do século XX.