Dos 37 maiores reservatórios naturais de água subterrânea do planeta, os sistemas de aquíferos, 21 perdem mais água do que conseguem repor naturalmente. Esta é a constatação do estudo publicado no periódico Water Resources Research, feito por universidades americanas, entre elas a Universidade da Califórnia (UCI), Irvine, EUA, em cooperação com a NASA.

Foram analisados dados obtidos pelo satélite GRACE (Gravity Recovery and Climate Experiment) da NASA, num período de dez anos (2003-2013), e também estatísticas sobre retirada de água do subsolo para atividades humanas.

As recargas naturais desses reservatórios, por chuva ou degelo, têm sido insuficientes para compensar a retirada de água e as perdas por variações climáticas desfavoráveis.

O uso da maioria dos sistemas de aquíferos avaliados estaria além do limite sustentável. Águas superficiais são mais fáceis de monitorar, quantificar e extrair do que águas subterrâneas. Mas, à medida que a população mundial cresceu, e os efeitos das mudanças climáticas se intensificaram, a reposição dos reservatórios superficiais se tornou menos previsível e menos confiável.

Assim, os reservatórios subterrâneos ganharam importância estratégica inédita, ainda mais em períodos de crise hídrica. A evolução desses recursos vitais foi monitorada na missão do satélite GRACE, que identificou variações gravitacionais das regiões onde há volumes imensos de água.

A partir dessas variações, foi possível aferir as diferenças anuais nos volumes de água dos 37 maiores sistemas subterrâneos do planeta. 

Desses, 11 sistemas estão na pior categoria de estresse hídrico, a maior parte em regiões densamente povoadas e sem recursos financeiros para investir em infraestrutura de prevenção contra eventual escassez futura. Esse cenário é propício para o surgimento de conflitos entre os países dependentes dessa água.

O AQUÍFERO BRASILEIRO

Um dos sistemas estudados é o Aquífero Guarani (SAG), que tem 70% de sua área em território brasileiro, distribuída por oito estados, nas regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste. O Guarani, com estimados 1,2 milhões de quilômetros quadrados, é o segundo maior sistema do planeta, e perdeu de 0,5 a 1,0 mm por ano, conforme os dados publicados.

Isso equivaleria a perdas entre 0,6 a 1,2 km³ de água, a cada ano.

Devido à crise hídrica do Sudeste brasileiro, a Universidade de São Paulo (USP) está desenvolvendo estudo para captar água do SAG e abastecer 300 mil pessoas na região de Piracicaba, a uma vazão de mil litros por segundo. Atualmente, essa população é atendida pelo Sistema Cantareira, que segue operando no “volume morto”, com apenas 16,4% do volume total, segundo a Agência Estado.

O PRÓXIMO PASSO

A grande questão é quanto tempo levará para que o restante da água desses grandes reservatórios se esgote, e em que ritmo, mantendo-se os níveis atuais de retirada. Ainda não é possível fazer estimativas confiáveis porque os dados sobre volume de água disponível são muito discrepantes, e o monitoramento por satélite não consegue medir a capacidade plena dos reservatórios.

Jay Famiglietti, professor da UCI e cientista sênior da NASA, resumiu, no site da CalTech/NASA, o próximo passo: "Dado quão rápido estamos consumindo as maiores reservas de água subterrânea do mundo, precisamos de um esforço global coordenado para determinar quanto resta".

Na última sexta-feira, a Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (UNFCCC) publicou relatório para a COP-21, mencionando que, para os 147 países comprometidos na redução de emissões de gases do efeito estufa, a segurança hídrica é a maior prioridade nas ações de adaptação. Informações confiáveis sobre recursos hídricos, como as disponibilizadas no estudo da UCI permitirão uma gestão compartilhada entre países, reduzindo, assim, o potencial de conflitos. Quantificar a água nunca foi tão necessário.