No Brasil, o direito à educação é um tópico previsto na Constituição vigente há algumas décadas. Em vários outros países, é uma normalidade que crianças exerçam esse direito. Até porque a educação é um dos poucos caminhos sólidos para se chegar a uma vida adulta mais plena e próspera.
Porém, em outras localidades do globo, a dificuldade de frequentar as escolas vem ganhando espaço. É o caso do Afeganistão, onde mulheres e meninas foram proibidas de estudar. Seu vizinho Irã tem seguido essa rota ultimamente. A diferença é que esse impedimento se alastrou, chegando a ameaçar a vida das meninas iranianas.
Um dos países mais fechados dentro do Oriente Médio, o Irã tem escrito mais uma página referente ao envenenamento de mulheres nas escolas. A novidade é que isso não é de agora. Vem acontecendo há algum tempo. Segundo alguns, o começo desses crimes teria acontecido em novembro de 2022.
Prisões
As últimas notícias acerca do problema do envenenamento tratam da prisão de mais de 100 pessoas envolvidas nessa ação em todo o território do Irã. Nem a capital do país, Teerã, escapou dessa atrocidade.
Segundo o comunicado do Ministério do Interior, os “inquéritos iniciais mostram que várias dessas pessoas, por maldade ou aventureirismo e com o objetivo de fechar as salas de aula e influenciadas pela atmosfera psicológica criada, tomaram medidas com o uso de substâncias inofensivas e malcheirosas”.
Detidos relataram que queriam gerar o medo e um ambiente desfavorável para as alunas.
Alguns parlamentares creem que os ataques às escolas voltadas para o público feminino provenham de grupos islâmicos conservadores, os quais são contrários às mulheres adquirirem educação.
O aiatolá Ali Khamenei, autoridade máxima do país muçulmano, reprovou os envenenamentos, qualificando de “crime imperdoável”.
No mesmo pronunciamento reivindicou “punição severa” aos envolvidos.
Onde há fumaça, há fogo
Apesar de só adquirir proporção no início de 2023, a primeira suspeita de envenenar estudantes femininas ocorreu em novembro do ano passado, na cidade de Qom. Dezoito alunas foram encaminhadas ao hospital com queixas de enjoo, falta de ar e dormência nos membros.
Em fevereiro deste ano, na mesma cidade de Qom, foram 100 vítimas de 13 escolas diferentes que precisaram de socorro médico.
Até agora, estima-se que mais de 5.000 meninas foram alvo desse crime em série. Ao todo, são 230 escolas que acusaram/detectaram esse triste episódio. Para se ter ideia da extensão do problema, são 25 províncias atingidas. O Irã é constituído por 31 províncias.
Mesmo com a divulgação por parte do Ministério do Interior a respeito da diminuição dos envenenamentos, as famílias, sob forte comoção, cobram medidas duras do governo.
Ainda que não dê para vincular uma coisa com a outra, não é totalmente descartável que a nova onda sofrida pelas mulheres iranianas tenha relação com a morte de Mahsa Amini, estudante de 22 anos que foi assassinada pela polícia moral.
Ela se recusou a usar o véu que cobre a cabeça, costume de países do Oriente Médio e faz parte de um código de vestimenta no Irã.
Contraste, contradições
O mês de março é especial para o povo iraniano: lá se celebra o Noruz, o equivalente ao Ano Novo ocidental, e que coincide com a chegada da primavera no hemisfério Norte. São 13 dias de festa e, geralmente, as escolas fecham para participar das comemorações.
Segundo uma mãe entrevistada em Teerã, “muitos responsáveis já pararam de enviar os filhos às aulas. A diretora da escola primária da minha filha é compreensiva. Ela mesma é mãe.”
No âmbito oficial, até o momento não houve divulgação e nem se fala qual ou quais foram as substâncias empregadas para realizar os envenenamentos.
Autoridades não informam quase nada e médicos e gente da área da saúde foram orientados a não se pronunciarem.
Esse suposto acobertamento faz a opinião pública local a acreditar mais na certeza de que grupos religiosos radicais tenham incentivado os atos. No início de março, registraram-se mais protestos em várias partes do país. Uma das reivindicações é que o governo ponha mais segurança nas escolas.
Cheirando mal
Com este mistério em torno da causa, um especialista foi procurado para saber qual o material usado na propagação desse episódio. De acordo com o especialista alemão em toxicologia Carsten Schleh, é bom possível que o vilão seja o sulfeto de hidrogênio. Os efeitos da substância, que tem odor semelhante a ovo podre, causam problemas respiratórios, náuseas e dores de cabeça. Para ele, a substância pode ter sido criada em laboratório, visto que é de fácil fabricação.