Em meio a uma pandemia causada pelo novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) forçou a saída de dois de seus mais importantes ministros. Primeiro foi Luiz Henrique Madetta, que o ocupava a pasta da Saúde, e na última sexta-feira (24) foi a vez de Sergio Moro, então ministro da Justiça e Segurança Pública, pedir demissão do cargo.

A saída de Moro serviu para aumentar mais ainda a crise política criada por Bolsonaro, que aposta na radicalização de seu discurso, ao mesmo tempo em que se esforça para boicotar o isolamento social. Diante deste cenário, o Brasil estaria se encaminhando para uma ditadura ou para um impeachment?

O site do jornal espanhol El País conversou com Marcos Nobre, filósofo, professor da Unicamp e presidente do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento) que fez uma análise do momento político atual do Brasil. Para Nobre, Bolsonaro está buscando refúgio em sua base ultra radical de eleitores enquanto busca um entendimento com o centrão no Parlamento para conseguir uma sobrevida, mas ele acredita que é apenas questão de tempo para que o líder do Executivo seja retirado da presidência.

Na entrevista, o filósofo diz ao El País que a popularidade de Jair Bolsonaro ficará reduzida apenas ao seu eleitorado mais radical, porém ressalta que isto por si só não assegura uma maioria social para o afastamento.

Para que isto possa acontecer, na Opinião de Nobre, os principais atores políticos devem se unir e negociar, caso contrário, corre-se o risco de se produzir outros Bolsonaros, “Não adianta só tirar o cara”, alerta Marcos Nobre.

Feudos

Após Bolsonaro ser eleito, Marcos Nobre afirmou ao El País que o Governo Bolsonaro era feito por feudos, e que um deles era o de Sergio Moro.

Agora, com a saída nada amistosa do ex-juiz da Lava-Jato, Nobre acredita que esta a saída de Moro neste momento específico tem várias funções.

Atualmente o país apresenta um número alarmante de mortes causadas pela Covid-19, algo semelhante com o que acontece na Espanha, e não se está discutindo o nível de preocupação que a situação merece, pois se está o tempo todo debatendo a crise política.

Desta maneira, existe um elemento diversionista relevante. Outro ponto, segundo ele, é que Bolsonaro se conscientizou que a pandemia irá afetar seu governo. No momento ele possui um terço do eleitorado, de acordo com as pesquisas, e ele sabe que não vai conseguir manter este número, diz Nobre. Então resolveu recuar e procurar abrigo em seu núcleo de apoiadores fanáticos, que segundo dados do Datafolha é por volta de 12% dos eleitores, conclui o filósofo.

O raciocínio do presidente seria que a crise econômica é inevitável e irão atacá-lo com o impeachment, então a melhor estratégia é garantir uma mínima base de apoio. Parte desse eleitorado que ele vai perder são apoiadores de Sergio Moro. O ex-ministro simbolizava uma expansão da base de apoio de Bolsonaro de 12% para 30% do eleitorado.

Porém, quando Bolsonaro volta para os 12% iniciais, ele decide fazer um governo de guerra, afirma Nobre. E, em um governo de guerra, não se pode ter uma pessoa que seja maior que o líder, continua. Esta seria uma explicação para a saída de Mandetta e depois Moro.

Perguntado pelo site se uma queda em sua popularidade seria o suficiente para a queda do presidente, o filósofo responde que não basta apenas que ele fique com apenas 12%, 10% ou 8% do eleitorado, também é preciso que seja formada uma maioria incontestável que peça por seu afastamento. Nobre relembra que na última pesquisa feita pelo Datafolha a maioria foi contra a atitude do presidente durante a pandemia, mas mesmo assim ainda eram contra a renúncia.

Isto comprovaria então que uma maioria não surge espontaneamente, porém ele ressalta que é grande a possibilidade de se chegar a uma maioria favorável ao impeachment. Mas que há obstáculos como a polarização entre esquerda e direita. Para Marcos Nobre, a esquerda ser verá obrigada a negociar com a direita para conseguir apoio a um pedido de impeachment que possa vir de alguma figura do centrão que possa ser considerada como um candidato em potencial. Como, por exemplo, um ex-ministro do STF ou ainda um ex-ministro da Justiça.