A definição, qualquer que seja, limita sempre a compreensão do que desejamos conhecer, e não raro termina por conferir uma aparente simplicidade a realidades complexas. Isso vale sobremodo para a Filosofia. Não é de pouca monta o que já se discutiu sobre o que seja a filosofia, qual a sua origem, qual o seu valor. Para aqueles que têm uma compreensão estreita da ciência e pensam ser esta a única forma de conhecimento verdadeiro – só à ciência caberia, portanto, o acesso à verdade das coisas -, a fraqueza da filosofia é não atingir ou formular conclusões válidas, cuja posse daria ao homem a certeza e a segurança necessárias à existência.
A aparente e discutível fraqueza da filosofia talvez seja a sua maior virtude. Por não tomar as definições como algo acabado, irretocável; por não limitar o conhecimento do mundo, sobretudo do mundo humano, às conclusões formuladas pelas diversas ciências, a filosofia configura-se como forma de saber fundado mais, bem mais na formulação de perguntas que na elaboração de respostas.
Para o filósofo e psiquiatra alemão Karl Theodor Jaspers (1883-1969), “a palavra grega filósofo (philosophos) é formada em oposição a sophos, significa o que ama o saber, em contraposição ao possuidor de conhecimentos que se designava por sábio. Este sentido da palavra manteve-se até hoje: é a demanda da verdade e não a sua posse que constitui a essência da filosofia (...)”.
Nesse sentido, para o filósofo Karl Jaspers, a filosofia se caracteriza mais pela busca do que pela posse da verdade.
Dos muitos caminhos da reflexão filosófica, seguramente não é o mais profícuo aquele que começa pela tentativa de possuí-la através das malhas de uma ou várias definições. A filosofia, o ato de filosofar, não se reduz a conceitos.
Dizia, a propósito, o filósofo Ludwig Wittgenstein (1889-1951), que “a filosofia não é teoria mas atividade”. O que quer dizer o célebre filósofo austríaco com esta afirmação aparentemente simples? Antes de mais nada, que filosofia não é uma doutrina, um corpo de conhecimentos rigidamente estabelecido, estático. A filosofia é movimento, mudança, cultura...
Ao contrário, filosofia é ação, é atividade reflexiva, é trabalho da razão, é produção de significados. Essa ideia nos remete ao filósofo grego Heráclito de Éfeso (535-475 a.C), ao afirmar que o homem nunca toma banho duas vezes no mesmo rio, porque da segunda vez o homem e o rio já não são os mesmos. Ou seja: trata-se da necessidade de se compreender a filosofia como processo, como um estar sendo, o que decorre diretamente da natureza dialética do homem e do mundo.
Dentre as várias formas de expressão do conhecimento humano, nenhuma talvez tenha enfrentado tantos preconceitos quanto à filosofia. Muitos a têm por um saber inútil, abstração vazia, especulação estéril. Outros a detestam e não relutam em suprimi-la em razão de seu poder crítico, de sua não aceitação do estabelecido.
Perguntaram a filósofa brasileira Marilena Chauí (2004): Qual seria, então, a utilidade da filosofia? E ela respondeu:
“Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil [...], então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil e todos os saberes de que os seres humanos são capazes”.