Um novo antidepressivo chegou ao mercado dos EUA em março. Chamado Spravato, o medicamente se mostra eficaz e rápido no tratamento de pacientes com depressão profunda. Enquanto remédios comuns mostram resultados após semanas, este age rapidamente, apenas algumas horas (ou dias) após o início do tratamento.
Baseado nas ações anestésicas da cetamina (também chamada de quetamina ou ketamina), o medicamento desenvolvido pela Janssen Pharmaceuticals Inc.
também gera controvérsias, já que a nova droga foi aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) dos EUA sob padrões menos rigorosos do que os exigidos para aprovar antidepressivos anteriores.
Ainda não está claro, por exemplo, o que acontece quando alguém deixa de tomar o medicamento, bem como seus efeitos positivos e negativos a longo prazo. Três pacientes se suicidaram logo após receberem a última dose da medicação durante o estudo.
Para Alan Schatzberg, psiquiatra da Universidade de Stanford, que deu entrevista a Science News, o Spravato levanta mais perguntas do que respostas.
Um novo uso para uma substância velha
A Ketamine está em uso há décadas e é composta por duas moléculas espelhadas, a esketamina e a arketamina. A novidade da medicação é que a cetamina jamais foi utilizada para tratamento de depressão. O Spravato foi desenvolvido a partir de uma dessas moléculas: a esketamina.
Ligada principalmente ao uso para induzir e manter a anestesia, também pode deixar os pacientes em um estado de transe e além de sedar, seu uso pode levar a perda de memória, alucinações, tontura etc.
Novo medicamente não é para todos
Estima-se que 5 milhões de pessoas nos Estados Unidos vivam com depressão grave. Apesar disso, o spray nasal que trata depressão não será para todos. Como o medicamento é passível de abusos, o Spravato só pode ser tomado em uma clínica, onde os pacientes serão monitorados por várias horas após a dose.
Essas regras foram estabelecidas também porque o Spravato foi amplamente testado em pessoas com depressão severa, porém, sua eficácia não é totalmente comprovada. Até agora, foram conduzidos três ensaios clínicos de um mês, nos quais os pacientes foram aleatoriamente escolhidos para receber o medicamento ou um placebo.
Spravato: escassez de estudos gera controvérsias
No terceiro mês de testes do novo antidepressivo, que incluiu 224 pessoas, os participantes tiveram melhora após um período de quatro semanas tomando Spravato duas vezes por semana. Os pesquisadores mediram os sintomas de depressão em uma escala de 60 pontos, sendo que quanto mais baixa a pontuação, melhor seria o desempenho do paciente.
Durante o mês do estudo, as pessoas que tomaram o placebo caíram 15,8 pontos em média. As pessoas que tomaram esketamina caíram em média 19,8 pontos.
Também foi realizado um estudo de longo prazo, no entanto, a controvérsia surgiu do fato de que este estudo maior incluiu pacientes que responderam positivamente ao Spravato nos testes mais curtos.
Perguntas não respondidas
O estudo de longo prazo, que durou mais de um ano, concluiu que 39 dos 86 pacientes, ou 45%, tiveram aumento nos índices de depressão após deixarem o uso do Spravato e passaram a tomar placebo. Em contraste, apenas 24 de 90 pacientes, ou 27%, tiveram aumento nos índices de depressão enquanto continuavam a receber a medicação a base de cetamina.
Essas recaídas em pessoas que mudaram de cetamina para um placebo são preocupantes, diz Schatzberg. “O que vamos fazer na prática, apenas manter as pessoas tomando esta nova droga para sempre?”.
Pacientes se suicidaram durante o estudo
Três dos pacientes que receberam Spravato nos ensaios morreram por suicídio depois de quatro, 12 e 20 dias após receberem a última dose do medicamento. De acordo com um documento da FDA, dado o pequeno número de pessoas estudadas, suas doenças graves e a falta de semelhanças nessas três mortes, “é difícil considerar essas mortes como relacionadas à droga”.
A empresa que fabrica a droga afirmou que os eventos suicidas foram causados pela depressão severa dos pacientes e não pela droga.
Já Schatzberg não concorda com esses argumentos, dizendo que parar de receber a droga pode muito bem ter algo a ver com os suicídios. "Você está induzindo algum tipo de dependência? E quando você tira as pessoas, elas se sentem péssimas e podem se tornar suicidas? Isso, para mim, é uma grande preocupação."
Dados existentes são inconclusivos
Como já dissemos, a ketamina vem sendo utilizada há décadas, tanto na medicina como em drogas ilícitas. Graças a isso já foram coletados vários dados. Em exames de ressonância magnética de pessoas que abusaram da ketamina por um longo período foram detectados danos cerebrais. Os próprios estudos apontam que tais danos também podem ter sido causados por outras fontes, no entanto estudos em animais também mostram danos cerebrais induzidos por cetamina.
Alguns estudiosos apontam que a cetamina pode agir como uma espécie de opioide, levando ao vício. Outros defendem que a substância pode estimular a formação de conexões entre as células nervosas, diminuindo os sintomas depressivos. Apesar da inconclusão, indústria farmacêutica, médicos e pacientes estão avançando sem todas as respostas.