Na última quinta-feira (25), o Brasil registrou mais de 1.500 novas vítimas da Covid-19, segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), tornando este dia o mais letal da pandemia até o momento. Neste mesmo dia, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), em sua transmissão ao vivo para as redes sociais, citou um suposto estudo que teria vindo de uma universidade da Alemanha, que afirma que o uso de máscara é prejudicial às crianças.
Segundo ele, o levantamento aponta consequências como dificuldade de concentração, dor de cabeça, irritabilidade, entre outros problemas.
As informações são da agência BBC News.
Na ocasião, Bolsonaro ainda afirmou que estaria aguardando um estudo mais detalhado sobre o tema “por parte de pessoas competentes”, e que não entraria em detalhes pois "tudo deságua em crítica" sobre ele.
Alemanha
Existe um estudo preliminar realizado na Alemanha sobre os efeitos do uso das máscaras de proteção utilizadas em crianças que foi publicado no mês de dezembro de 2020, e que mencionava os problemas relatados por Bolsonaro. Porém, não está claro se o presidente se referiu a esse estudo ou algum outro.
A pesquisa preliminar foi feita por médicos da Universidade de Witten/Herdecke, e não teve a revisão de seus pares. Ou seja, o estudo não foi posto à prova por um ou mais especialistas da mesma área dos autores.
A plataforma de publicação onde a pesquisa foi divulgada, avisou que o estudo não deve ser dado como conclusivo ou ainda ser usada como fonte para práticas clínicas ou pela imprensa como fonte válida.
Enquete
O estudo preliminar foi realizado tendo como base uma enquete online, onde participaram pais ou responsáveis por cerca de 25 mil crianças e adolescentes.
Trata-se de uma análise de custo-benefício do uso das máscaras de segurança para este público específico, e não de negar a eficácia do item de segurança, como deu a entender Jair Bolsonaro.
Nessa esteira, o próprio estudo faz importantes observações, como por exemplo que pais cujos filhos não apresentem efeitos colaterais possuem menos chance de participar da pesquisa.
Também é avisado que o link para o levantamento foi usado por fóruns de redes sociais que criticavam o uso de máscaras e outras medidas que visam à proteção contra o coronavírus.
A pesquisa destaca também que os efeitos relatados pelos pais são “suspeitas de efeitos colaterais", e não se tratam exatamente de efeitos colaterais. Ou seja, são eventos que podem ser visto pelos pais, porém não estariam obrigatoriamente relacionados ou seriam causados pelas máscaras. Em resumo, eles pontuam que as informações tratam-se de considerações cujos efeitos causais devem ser verificados.
A Health Feedback, organização sem fins lucrativos que convida cientistas para participar da verificação de informações que dizem ser baseadas na ciência, examinou o estudo.
A entidade afirmou que, com base na pesquisa, não é possível comprovar uma relação causal entre o uso das máscaras e os efeitos colaterais relatados.
O estudo também não tem controles, o que quer dizer que a pesquisa não formou um outro grupo de crianças que não estivessem usando máscaras para comparar com o grupo que estava usando. Sendo assim, é impossível vaticinar que os efeitos negativos relatados foram por causa das máscaras teriam acontecido mesmo se as crianças não as tivessem usando. Também não foi avaliado pelos autores da pesquisa se as crianças já tinham condições pré-existentes, e este foi outro problema apontado pela Health Feedback.
Negacionismo
Não é a primeira vez que Jair Bolsonaro põe em dúvida a eficácia das máscaras, contrariando o que desde junho diz a Organização Mundial da Saúde (OMS).
O órgão global recomenda o uso de máscaras para as pessoas que precisarem sair de casa. Ainda em abril passado, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), dos EUA, já havia feito a mesma recomendação.
O próprio Ministério da Saúde do Brasil também recomenda o uso das máscaras de tecido para a proteção contra o coronavírus. No país existe uma lei sancionada pelo próprio Bolsonaro que determina que seja obrigatório o uso de máscaras de proteção individual para que se possa circular em lugares públicos e também em locais privados com acesso da população.