O Acarajé é uma iguaria tipicamente baiana. As baianas de acarajé, responsáveis pelo preparo e venda desses bolinhos, acabou por caracterizar a cultura baiana, expressando a cultura negra através das indumentárias e da religiosidade e outros elementos.
É tão emblemático e representativo que, as baianas de acarajé configuram o mais conhecido cartão postal baiano, ao ponto de ser tombado como Patrimônio Cultural pelo IPHAN, em 2005 e reconhecido como Patrimônio Cultural de Salvador pela Câmara Municipal, no mesmo ano. Em 2009, foi criado em Salvador, o Memorial da Baiana de Acarajé, com o intuito de situar a história, tradição e coletas de informações sobre o ofício.
No dia 25 de novembro é celebrado o dia das Baianas de Acarajé, sem as quais esse quitute não existiria. O que poucos sabem é que as baianas de acarajé foram as primeiras mulheres empreendedoras do Brasil. Com a venda dos bolinhos, garantiam suas alforrias e o sustento de suas famílias. E essa história será revelada nesse artigo.
Contextualizando a história
De acordo com informações da associação Nacional das Baianas de Acarajé, essa é uma especialidade feita com massa de feijão-fradinho, sal e cebola, enrolados e fritos no azeite de dendê. Em geral, vem pode vir acompanhado de outros pratos típicos da África, presentes na Culinária baiana, como camarão seco, vatapá, caruru e pimenta.
De acordo com a primeira descrição etnográfica do acarajé, realizada em 1916, informa que inicialmente o feijão-fradinho era ralado na pedra, utilizando um rolo cilíndrico, com o objetivo de moer e triturar mais facilmente o feijão.
No passado, o quitute estava associado a Orixá Iansã. De acordo com a língua iorubá, o nome provem da junção do termo “àkàrà”, que em português significa "bola de fogo", e “je”, que significa "comer". Portanto, a reunião dessas duas palavras pode ser traduzida como "comer bola de fogo".
De acordo com o mito, Iansã, então esposa de Xangô, foi enviada por seu marido à casa de Ifá buscar um alimento.
Ao entregar o preparado a Iansã, Ifá recomendou que Xangô deveria falar ao povo depois de comer o que havia sido entregue. No entanto, desconfiada, Iansã decidiu provar o preparado antes de entregar ao marido, tranquilizando-se ao perceber que nada aconteceu.
Já em casa, Iansã entregou a Xangô o alimento, cuidando em repassar a recomendação feita por Ifá.
Mas, após comer e ir falar ao povo, labaredas começaram a sair de sua boca durante seu discurso. Preocupada, Iansã saiu em seu auxílio, detida pelas chamas que insistiam em sair de sua boca. Depois do ocorrido, o povo passou a saudar os Orixás como os reis do fogo.
Entretanto, o primeiro bolinho preparado no tabuleiro da baiana e denominado “acará” é oferecido à Iansã e segue um rito específico, tanto em forma como em preparo, deve ser redondo e ornado com sete ou nove camarões defumados. Já o acará de Xangô é oval, circundado por outros seis ou doze acarás do mesmo formato,
Baianas de Acarajé, uma trajetória de resistência
É possível identificar facilmente uma baiana de acarajé por suas indumentárias, que compostas por um torço de pano na cabeça, acompanhada por um longo vestido branco de renda, colares e outros adereços.
Saem para vender seus quitutes fritos na hora, em tabuleiros dispostos pelas ruas da capital baia, especialmente.
Historicamente, a produção do quitute é tipicamente feminina e está diretamente relacionada ao candomblé e ao culto a Orixá Iansã. Nesse sentido, a relação com a religiosidade evidenciava sua força, no que a massa era feita dentro do terreiro, de onde a baiana deveria sair com todas as obrigações cumpridas para com o seu Orixá.
De origem africana, a comercialização da iguaria chegou ao Brasil trazida pelos escravos vindos da África como mão de obra. Nesse período da história, haviam cativas conhecidas como “escravas de ganho”, cuja a função consistia em vender mercadorias para as patroas nas ruas das cidades.
Comercializava-se de tudo, mingau, bolo, cocada, etc. Após as vendas, cabia as escravas repassar a maior parte do lucro obtido com a comercialização de seus produtos para as patroas, no entanto, lhes era lícito ficar com um pequeno percentual dos ganhos.
Justamente por essa razão, muitas conseguiram garantir o suficiente não apenas para sustentar suas famílias, mas para comprar a própria liberdade. Nesse contexto, as baianas de acarajé podem ser consideradas a primeiras mulheres empreendedoras da Bahia. O lucro obtido nos tabuleiros, serviu também para o financiamento de terreiros de candomblé e para auxiliar a criação de irmandades religiosas.
No entanto, mesmo após a abolição da escravatura, muitas mulheres deram seguimento ao ofício e hoje, as baianas do acarajé são mundialmente conhecidas.
Devidamente reconhecidas desde 2005 como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo Iphan, atualmente, o acarajé é uma profissão regulamentada e que beneficia milhares de mulheres.
No dia 20 de novembro, celebra-se o dia da consciência Negra, mesma semana em que é celebrado o dia das Baianas de Acarajé, em 25 de novembro, consagradas como um marco da religiosidade, da cultura negra e do empoderamento feminino.