Um estudo publicado na terça-feira passada, 13, no repositório de artigos medRxiv, afirma que o novo coronavírus é capaz de afetar as células do tecido cerebral. Coordenada por grupos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade de São Paulo (USP), a pesquisa teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Além das instituições, atuaram nos estudos colaboradores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), do Insituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), bem como da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

De acordo com os resultados, o SARS-CoV-2 pode de fato infectar o cérebro, em especial os astrócitos, que são as maiores e mais numerosas células encontradas no sistema nervoso central. Os pesquisadores explicam que a infecção das células levou a alterações no metabolismo e afetou o funcionamento de neurônios e neurotransmissores.

Ainda segundo estudo provisório, que ainda não foi avaliado pelos pares, até mesmo pessoas que desenvolveram formas leves da Covid-19, apresentando pouca ou nenhuma dificuldade respiratória, apresentaram alterações no córtex.

O córtex é a área em que se concentra a maior parte dos neurônios, comandando funções como a memória, a linguagem, a concentração e até mesmo a consciência.

A alteração em sua espessura, provocada pelo vírus, poderia explicar porque algumas sequelas são persistentes em indivíduos que contraíram a doença.

Realização dos primeiros testes

Ainda em julho o Departamento de Neurologia da Unicamp coletou relatos através de um questionário online sobre sintomas duradouros em pessoas que contraíram o coronavírus.

Esses dados preliminares mostraram que 67% das pessoas recuperadas e que não chegaram a ser internadas ainda tinham algum sintoma neurológico.

Posteriormente, foram coletadas amostras de tecido cerebral de 26 pacientes que faleceram de Covid-19. Em 5 delas, foram observados indícios de necrose, inflamação e lesões neuronais.

A pesquisa também contou com exames realizados em 81 voluntários na Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. Todos eles contraíram formas leves da doença e já haviam se recuperado na ocasião em que foram submetidos a uma ressonância magnética.

Os exames foram conduzidos cerca de 60 dias após as pessoas terem recebido diagnóstico positivo de contaminação, sendo que um terço deles relataram ainda ter algum sintoma neurológico ou neuropsiquiátrico. A maior parte dos indivíduos disse ainda sentir dor de cabeça ou fadiga. Entre as sequelas estavam também alteração da memória, perda de olfato, ansiedade, sonolência durante o dia, depressão, perda de paladar e até perda de libido.

Os voluntários passaram por avaliação cognitiva, através de testes neuropsicológicos, nos quais apresentaram resultados de desempenho, em algumas tarefas, abaixo da média brasileira.

Próximos passos

Após os primeiros testes, a Unicamp divulgou um formulário online em busca de mais voluntários, e já conta com mil indivíduos, que serão avaliados ao longo de 3 anos. Um resultado prévio, com os 200 primeiros inscritos, apontou uma persistência de sintomas em 75% das pessoas, mesmo tendo sindo infectadas havendo mais de 2 meses.

Segundo Clarissa Yasuda, coordenadora da pesquisa no Departamento de Neurologia da Unicamp, ainda não é possível dizer se esses sintomas são passageiros ou permanentes, nem mesmo se todos são consequência da Covid-19.

O recrutamento de voluntários ainda está ocorrendo e os interessados podem entrar em contato através de e-mail ou por WhatsApp.