Enquanto as atenções mundiais se voltam para as Eleições na Alemanha, onde se especulam os rumos que a União Europeia irá tomar e como a primeira economia daquele continente vai se comportar no xadrez da geopolítica multilateral, existe um outro país pertencente à Europa que está passando pelo rito das eleições e fica mais isolado de seus conterrâneos.

A Islândia, conhecida por suas terras gélidas e vulcões, acaba de registrar um feito inédito para a humanidade.

Tornou-se o primeiro país a eleger mais mulheres que homens em seu Parlamento.

Sonho de consumo de muitas militantes pelos direitos das mulheres e feministas, a participação política delas era considerada uma quimera, algo utópico. Quem chegou mais perto de mais mulheres na política foi a Suécia, com a marca de 47% da presença delas no Parlamento.

A comemoração e a vitória têm um motivo: agora os islandeses contarão, em sua câmara de representantes, com 52,3% da ala feminina. A votação e a sua respectiva contagem aconteceram a partir de ontem, 25/09.

Muito provavelmente, os resultados devem sair hoje, domingo, uma vez que a população total da ilha chega a 370 mil habitantes.

Composição e expectativas

O Legislativo da Islândia é composto por 63 cadeiras e, de acordo, com os números até agora divulgados, 33 postos serão ocupados pelas mulheres.

Lá, a maioria dos partidos políticos reserva uma quota mínima para a inscrição de mulheres entre os possíveis candidatos. Ao contrário de outros países, a Islândia não possui uma lei que obrigue essa reserva de quotas.

Fato ainda mais interessante: a Islândia é considerada uma vanguarda, quando se trata de feminismo e causas afins. Ela lidera há 12 anos a lista do Fórum Econômico Mundial para a igualdade de gênero.

Parece que isto está no sangue de sua população. A combinação entre política e vontade popular ganha incentivo e voz.

“Tenho 85 anos, esperei a vida toda para que as mulheres fossem a maioria (...) e estou muito feliz.”, disse Erdna, habitante da capital, Reykjavik.

No entanto, toda e qualquer eleição guarda algum traço de surpresa ou contrariedade. Embora governada por uma primeira-ministra, o resultado pode ser um tanto decepcionante para Katrin Jakobsdottir. Seu partido de esquerda perdeu alguns assentos e ficou atrás de seus dois maiores aliados de direita.

Aliança entre esquerda e direita?

Um pouco improvável para muitas Nações do mundo, o atual Governo islandês perdura com uma aliança ideológica inusitada e costurada entre partidos de esquerda e de direita.

O vencedor, até o momento, é o partido de centro-direita denominado Partido do Progresso, o qual abocanhou mais 5 cadeiras no Parlamento, em relação ao último pleito.

Já o partido conservador foi beneficiado porque as urnas mostraram sua permanência com 16 assentos e a preferência de 24,4% dos votantes.

Com isso, a radiografia política da Islândia mostra uma tendência de mais força para a direita, levando a crer que negociações mais extensas sejam feitas nos bastidores para se manter a governabilidade e até sobre o futuro do único partido de esquerda presente na coalizão.

Sobre a atual primeira-ministra

Katrin Jakobsdottir é a atual governante máxima e filiada ao Partido Verdes (de esquerda). A partir de 2017, ela mexeu em impostos, tornando-os mais progressivos. Investiu na habitação e aprovou o prolongamento da licença parental. Seu combate contra a pandemia de coronavírus foi elogiado – a Islândia registrou apenas 33 casos.

Desde 2008, a ilha passou por grandes dificuldades, desde a quebradeira geral dos bancos, abalando o sistema financeiro local, até instabilidades, escândalos e crises políticas. Só em 2017 é que os islandeses puderam respirar aliviados.

Essa inovação da Islândia foi notada em outros países. A Ministra para a Igualdade de Oportunidades e Família da Itália, Elena Bonetti, escreveu em seu Twitter, que “o novo Parlamento da Islândia tem, pela primeira vez na Europa, uma maioria feminina. A qualidade da democracia se mede com a capacidade de tornar as mulheres protagonistas da vida política. Bom trabalho e que essa eleição se espalhe por toda a Europa.”

O resultado das urnas mostra que Katrin terá que passar por uma prova: saber se os seus atuais parceiros e vitoriosos das eleições quererão continuar a parceria, mantendo uma estabilidade geral dentro do país.

Com certeza, esta estabilidade é o desejo maior dos eleitores.

A primeira-ministra precisa considerar justamente a quantidade de aliados dentro da câmara legislativa: 38 integrantes pertencem a um dos três partidos unidos. Resta saber se haverá o gesto de “jogar a toalha” ou, em nome de se obter a maioria, a coalizão se salve e prossiga em um novo cenário mutante.