Parceiros econômicos do Mercosul, a Argentina e o Uruguai passaram por Eleições presidenciais no último fim de semana, indicando insatisfações, desejo de mudança e algumas dúvidas quanto ao futuro político e ao destino nacional a ser traçado.

Aliás, a América do Sul como um todo vem se notabilizando por ser um caldeirão de transformações e revoltas populares. Haja vista a permanente crise generalizada na Venezuela, os tumultos e quebra-quebras feitos no Equador e no Chile e as recentes eleições para cargos diretivos na Colômbia e na Bolívia. Trata-se, com certeza, de um rico panorama de promessas, agitações e efervescências.

Sem segundo turno na Argentina

Os argentinos foram às urnas e ratificaram o que as pesquisas de opinião já sugeriam: a chapa composta por Alberto Fernández e Cristina Kirchner venceu e governará por quatro anos a partir de 10 de dezembro deste ano.

O resultado da votação mostrou uma tendência que o Brasil conhece bem – a polarização política. Os peronistas obtiveram 47% dos votos, enquanto a chapa de Maurício Macri ficou com 40% dos votos. Visto que a coalizão “Frente de Todos” conseguiu mais de 45% do total, a legislação eleitoral argentina dispensa a realização de segundo turno.

A situação social e econômica da Argentina é grave, com inflação alta e se calcula em 30% a população que vive em condições de pobreza.

Fora o problema com os 10% do povo que não possui habitação. Muitos sem-teto são acometidos por tuberculose.

Em seu discurso de vitória, o advogado e professor de 60 anos Alberto Fernández agradeceu a todos e salientou a escolha popular por uma “nova ordem”, enfatizando uma Argentina mais solidária, dando mais importância à saúde e educação públicas e aos trabalhadores.

Declaradamente contrário à tendência esquerdista, o presidente Jair Bolsonaro terá que descascar alguns “abacaxis”. Primeiro, terá que se conformar com a oposição ideológica entre os dois países e, segundo, terá que se equilibrar com dificuldade numa “corda bamba” se quiser dar continuidade ao bloco do Mercosul e às relações comerciais com os argentinos em detrimento de suas opiniões pessoais.

Para o próprio bem do Estado brasileiro e da balança comercial, uma vez que a Argentina é um importante comprador.

Com segundo turno no Uruguai

Espremido (no bom sentido da palavra) geograficamente entre o Brasil e a Argentina está o pequeno Uruguai, centro administrativo do Mercosul.

Os dois candidatos à cadeira de presidente, Daniel Martínez e Luís Lacalle Pou, disputarão o segundo turno, que se realizará em 24 de novembro. Porém, a vantagem foi um pouco maior do que a observada na Argentina. Enquanto a “Frente Ampla” de Martínez angariou cerca de 39% dos votos, Luís Lacalle (do Partido Blanco – de tendência de centro-direita) ficou com 28%.

Se a estatística mostra um certo conforto da situação, a qual Daniel Martínez –de esquerda– representa, existe certa cautela no ar.

É que os outros candidatos que ficaram para trás no primeiro turno uruguaio adiantaram seu apoio a Luís Lacalle. Num rápido cálculo sobre as porcentagens registradas no último fim de semana, caso se repita o cenário, Martínez sofreria uma derrota na votação final.

Ex-prefeito de Montevidéu, Daniel Martínez precisará de bastante eloquência e “jogo de cintura” para conquistar a confiança dos eleitores dos outros candidatos. Se nada for feito, o revés é bem provável. Sabedor disso, ele pediu para que os uruguaios não deem um “cheque em branco” a favor da austeridade, bandeira empunhada por Lacalle.

O tabuleiro político do Uruguai tem outros ingredientes que contribuem para a subida da direita ao poder.

A economia está estagnada, o desemprego e a violência aumentam e o país pode cair numa recessão. A futura composição do Congresso do Uruguai será de oposição, caso Martínez vença o segundo turno. Isso significa que Daniel Martínez será forçado a buscar apoio e terá que negociar muito com o Legislativo.

A Frente Ampla desfruta de certa popularidade graças às políticas sociais, reduzindo a pobreza e a desigualdade e, justamente por isso, o Uruguai contraiu um deficit fiscal elevado. Encontrar o equilíbrio entre finanças públicas e benefícios à população é um desafio, quase uma utopia.

Por sua vez, Luís Lacalle tem a proposta de cortar o deficit fiscal, racionalizar os gastos do Governo e prometeu uma tarifa mais barata para os combustíveis. É bom frisar que este último item foi o estopim que desencadeou a revolta do povo no Equador.